O que é a dor da discriminação, dita pelo tom de pele ?

Em conversas com um amigo, com capacidades enormes na ilustração e na capacidade de relação com os outros e que pede à sua maneira - ou tal eu encaro como pedido (que me corrija se estiver errado), ser visto e escutado, inicio pois esta reflexão.

Eu nasci com um certo e determinado tom de pele e numa certa e determinada família e numa certa e determinada zona geográfica. E agradeço por isso.
Agradeço mas não me orgulho de tudo o que fizeram tais antepassados, pois disso não me posso responsabilizar. Ainda assim agradeço pois é a única forma que conheço de viver em paz comigo mesmo. Agradeço todo o sofrimento alguma vez passado. Agradeço toda a ignorância alguma vez sentida e que terá protegido tais pessoas que talvez não tivessem as ferramentas para lidar com tal conhecimento. Por todo o sofrimento causado peço perdão, por todo aquele que eu causei alguma vez. E se os que fizeram porcaria não o souberam fazer (pedir perdão), problema deles, não meu. A mim cabe-me limpar a minha porcaria e a do meu filho enquanto ele não o souber fazer - e espero que saiba rápido, e tento cuidar disso estando o mais tempo que consigo por casa…mesmo que não seja o “pai perfeito” ou “companheiro perfeito”, para lá quero caminhar, sendo que sobre a perfeição, convido a ler: Reflexões para a Construção de Paz enquanto se mediam acordos internos e externos. Reflections on Peace Building while mediating Inner and outer agreements - paz - Fórum de Mediação de Conflitos.

Posso apenas responsabilizar-me por minha própria ação e emoção - sendo emoção uma replicação eterna de sentimento. Sentimento dura muito pouco tempo - ora vá observar bébés e perceberá. A emoção essa - é história repetida mentalmente e perpetuada corporalmente, sem a pessoa ter consciência disso.
Se eu não fosse grato pelo meu tom de pele, então seria porque algo de errado estaria.

A esse tom de pele, que na prática não acho que seja disso que se trata, está colada uma existência e um sofrimento que é passado de geração em geração. Uma cultura de racismo que é passada, de cada vez que se vê um filme na tv onde o vilão, o ladrão, o assassino, tem uma determinada tonalidade de pele ou penteado. Onde as pessoas são agrupadas por tom de pele geograficamente.

De cada vez que alguém conta uma anedota que contém o tom de pele e não sabe diferenciar o contexto da anedota da vida real. Que não compreende o que a faz rir.
De cada vez que alguém faz um comentário racista, que possivelmente lhe foi incutido no seu tempo de militar na óptica da conquista, se não antes em sua casa, quando era ainda criança.

Penso que talvez se passe essa cultura, com alguma certeza, por medo.
È verdade, medo de morrer. Medo pelo que os antepassados fizeram.
Medo de não ser respeitado, de não ser visto.

Passam-se culpas sem saber que se pode mudar a qualquer instante.
E para o saber mesmo pode-se ler sobre isso, mas mais importante é ter com quem praticar isso, isso que é mudar a nossa cultura individual para uma que verdadeiramente e em qualquer circunstância nos traz paz e bem-estar, de forma segura.

É estar consciente socialmente que o racismo só é propagado numa cultura por medo de ser invadida, roubada. Por medo de ter espaço para viver. Por medo de não ter o que comer. Por medo de ser minoria. E por isso se inventam ferramentas e armas para se ser mais forte. Por medo de ser mais fraco. Por medo de ser abusado, violado. Tantos medos precisam ser transformados.
Em possibilidades.

Portanto, com este texto tento matar o eu que discrimina, o eu racista, que me foi passado.

Partilho o que me foi partilhado, por um amigo, de outro tom de pele, porra, coitado ! NÂO ! Não és coitado nenhum. Tens uma força, uma capacidade imensa. Acorda para a vida. Não mates, não roubes. Não atires a tua raiva para cima dos outros → Nem todos estão preparados para a receber. Cria contextos seguros para a gritar e encontra formas seguras de a expressar a quem o grito também lembrar dôr. Cuida de quem tem medo do grito, e canaliza toda a energia para algo mais produtivo. Se a tua arte é pois o grito, então monta uma exibição, um espetáculo do GRITO.

Pede se precisas de comer e não tens como. Pede se tens frio e precisas de abrigo e não tens como ! E se alguém se negar, vai para a rua gritar o teu pedido !
E POR FAVOR, pede de forma empoderada. Pede com toda a tua garra.

Em mim terás pois um amigo, que também procura sobreviver.

Partilho pois então os endereços que me foram partilhados e as vozes que me foram partilhadas, pelos que alguma vez tiveram medo do racismo e deles foram vítimas, acorrentados, torturados:

Sobre ser pessoa negra de pele escura- A nossa dor não transparece, estamos todos doentes por conta desta sociedade, deste sistema e destas pessoas racistas, mas a nossa dor não transparece. Ninguém vê uma pessoa agredida se na sua pele não transparecer dor e a minha pele não transparece dor. vocês entendem o que eu digo?A nossa pele não transparece dor, a história de sofrimento marcada pela escravização dos nossos corpos, a dor de não poder falar, de não poder amar de não poder viver não transparece. A dor marcada pela agressão racista quotidiana pelo mal que nos causa esses estereótipos criados sobre o meu corpo, sobre o nosso corpo negro, não transparece. A dor marcada por toda a agressão violenta da vigilância, da desconfiança, da reprovação do meu corpo do corpo negro, da negação da minha existência, da negação da existência dos meus iguais, da proibição de sonhar, de existir sem justificar, sem ter de explicar e explicar e explicar, essa dor ela não transparece. Eu sofro racismo, sou policiada, sou vigiada, e sou forçada a explicar e tento explicar mas não consigo porque a minha dor não transparece, então eu perco razão, eu sou histérica porque preciso gritar porque a minha dor ela não transparece na minha pele negra escura, não é visível na minha pele que fico nervosa, que fico magoada, que me sinto violentada. Então eu preciso chorar, eu preciso me desfazer, eu preciso cair eu preciso me matar para que minha dor transpareça. Não sei se é mais violento sofrer racismo ou se é ter que conseguir provar que o sofreste pois no teu corpo, na tua pele não transparece dor.

Alciony Silva - Vou escrever poemas só para quem me ama.... | Facebook
Alex Shabaz:
Vou escrever poemas só para quem me ama. Não mais gastarei tempo ou suor a trocar ofensa ideológica com gente estranha que está tão centrada em si mesma que não consegue interpretar ou sequer entender aquilo que eu digo.
Direi uma última coisa no entanto: sistemas onde reinam a supremacia branca, classismo e patriarcado não são progressivos para pessoas negras.
Nenhum indivíduo negro pode ascender económica, social e politicamente onde o seu corpo é explorado, segregado e muitas vezes eliminado fisicamente. Os seus gritos de dor, exaustão e desespero jamais serão ouvidos.
É por essa razão que eu me pronuncio contra o racismo, colorismo, capitalismo e patriarcado.
Ninguém está a salvo!
Por isso, acho que chegou a altura de pararmos de olhar para nós mesmo na perspectiva de seres colonizados a quem foi roubado o direito de existir fora dessa óptica.
Todas as formas de opressão andam de mãos dadas e não podem coexistir com a vivência negra, pois isso significaria mais uma vez a subjugação da parte dominada.

Falou que é mimimi, já sei que não consegue desenvolver raciocínio… nem perco meu tempo. Se quiser entender de verdade e dialogar, pode vir que mamãe me ensinou a ser bem didática!

Mas lembra que SOMENTE quem sente a opressão, pode medir a dor. Quem ta na outra ponta, pode no máximo entender, e fortalecer para que essa dor não aconteça mais ou para que diminua.

Mas em resumo, se eu digo que sua piada não é engraçada, que me machuca e me ofende, apenas pare. Não importa nosso grau de amizade ou quanto tempo eu aguento isso.
Se alguém se sentiu oprimido, apenas entenda e Pare!

Eu vou ser didática, afinal você cresceu aprendendo que isso é correto. Mas se continuar, não vou respeitar sua idade, posição espiritual, grau de amizade ou seja la o que coloque respeito entre nós.

Afinal, o respeito precisa ser mútuo.