Dia 19 - 2023/07/16

Antes de ler este texto, lê antes Sobre a categoria Diario pessoal - científico?

6h27 de dia 17

Ontem deitei-me pelas 22h40 e já não quis escrever. Escrevo agora. Hoje sinto-me mais descansado do que ontem. Dormi melhor. Já fiz tb as minhas 50 + 50 flexoes e 60 abdominais e ainda experimentei dar uma cambalhota para trás, lembrando ver o meu filho a tentar dar uma e eu n saber bem explicar como se faz. Desta minha ultima cambalhota percebo que é um misto de impulso das pernas com o uso do peso das mesmas que faz conseguir dar a volta…mas não sei se isto é suficiente para ele conseguir aprender.
O chão deste quarto é de pedra, logo algo frio. Tenho a opção de pedir um colchão de yoga se quiser. Logo se vê.

Ontem só me levantei pelas 7h00 e lembro-me de ter acordado de noite depois de um sonho que tenho ideia de n ter apreciado mas que não consegui reter…como aliás é costume. Não consegui, ainda, e em tempos tentei, criar o hábito de escrever os sonhos.
Depois desse sonho não dormi nada bem. Lembro-me de olhar para o relogio por volta das 5.00 e na cama continuar.
Hoje levantei-me pco depois das 5.30.
Ontem de manhã, ao abrir o estore do quarto senti-me algo encadeado pela luz do sol, ainda que não o conseguisse ver da janela do quarto, que só abre em cima.
Depois, após o banho matinal, acho que estive a avançar na leitura do livro eletrónico do Steve… Rosner acho que é o apelido (que se auto-denomina de “the career catalyst”). Saí do quarto já passava das 9.00, já depois de ter comido uma queijada que me tinha sido oferecida no dia anterior ao almoço,. No refeitório não estava ninguém. Peguei nos cereais clusters que me tinham sido dados a escolher no dia anterior, a par com o leite de amêndoa, e pequeno-almocei. Entretanto, tv depois ja de tomado o pequeno almoço) perguntou-me a psicóloga-estagiária de serviço se eu tinha dormido bem (ou algo parecido) e eu disse que não, que tinha tido um sonho e dps dormido mal desde então.

Que bom haver alguém que pergunta de forma interessada sobre o nosso descanso.

Depois retomei as leituras do mesmo livro e lembro-me de ter comido nessa manhã uns 2 ou 3 queijinhos redondos e uns 2 triangulares. Gosto do sabor dos queijos…um mais mole que o outro, da forma como se desfazem na boca, do teor de sal. Porque apreciarei tanto o queijo? Vem-me à memória tempos de criança em que eu estava a ver televisão e a minha mãe me trazia um prato com queijo e cenoura…e como eu partia o queijo em bocadinhos pequenos, para ir comendo um a um (não negando a possibilidade de por vezes comer mais que um).

Lembro-me de alguém passar atrás de mim enquanto eu estava a ler, na mesa branca redonda da sala e perguntar a alguém, tv tb para mim, se se queriam juntar para fazer a mousse. Continuei na minha leitura. (Voltei aqui após estar mais à frente no texto. Já não sei se a mousse foi feita antes de almoço se ao jantar, pois só a comemos ao jantar)

Já passava das 12.45 quando fui arrumar o livro eletronico, o caderno e a caneta.
À mesa do refeitório, estava já sentado um dos residentes da casa, aguardando.
Passado pouco tempo estávamo-nos a servir, desta vez havia apenas um tipo de prato: bacalhau que ouvi alguém dizer ser espiritual e que concordo e sopa: canja. Ao servir-me reparei que uma das residentes entretanto chegou e estava bem perto de mim. Ao ponto da psicoterapeuta de serviço dar-lhe a dica para ela não ficar tão perto. Ela não mudou de posição. Eu acabei de me servir e fui-me sentar. E depois pensei se e como podia fazer sentido eu dizer-lhe para me dar mais espaço.
Esta residente tem tido este perfil: parece ainda estar muito no seu mundo e por vezes ignorar o espaço dos outros. As técnicas de serviço vão-lhe dizendo as coisas que sentem necessidade de dizee, por vezes repetindo. E já a ouvi responder também, indicando que estaria a ouvir e concordava com os pedidos feitos. Entendo que faz parte do seu caminho esta fase e questiono-me sobre qual será a sua história.

Creio ter feito, se não faço agora, a ponte com o facto de por vezes me ser dificil dizer que não e de afirmar mais o meu espaço. Acho que tenho um nivel de tolerância bem grande, só que às vezes apanho-me no que me parece ser uma “desvalorização do desconforto”.
Isso por vezes é útil, pois permite-me fazer coisas mesmo sentindo algum desconforto…no entanto outras é apenas uma forma de reprimir emoções e que tenho algum receio que no longo prazo possa ser prejudicial.
Quiçá consiga desenvolver a prática de ser gentil e afirmativo em simultâneo.

Terminado o almoço recolhi-me para o quarto. Devolvi a chamada aos meus pais, fiz um ponto de situação e escutei o que sentiram necessidade de me dizer. Já tinham lido o meu texto do dia anterior e tinham também as suas reações ao mesmo para expôr.
Fico contente que tenhamos também este canal de comunicação, que não sendo o mais direto, facilita-me para ir dizendo o que sinto e penso, sem no momento precisar tb de lidar com as emoções dos outros.

Observo em mim esta capacidade de por vezes sentir em mim o que é dos outros. E tenho vindo a aprender a gerir isso, ainda que me parece que ainda há caminho a fazer neste domínio. Desenvolver esta capacidade de criar “bolhas energéticas”, protegendo esse meu campo também, para não me deixar “afetar” tanto.
Claro está que esta noção de separação de identidades e emoções apenas é útil até certo ponto, porque na prática, não seremos todos parte de um grande Todo?
E assim sendo - pois diria ser hoje inegável sermos constituídos de átomos e partículas que a essa escala, podendo ser diferentes, estão todos em relação entre si, talvez faça sentido, bom não, talvez, mas com certeza faz sentido desenvolver essa capacidade de escuta energético-emocional e encontrar em mim o equilibrio suficiente para inspirar estabilidade e tranquilidade também em meu redor, quais tempestades que cessam, e gotas de chuva que acabam por repousar no mar, ou nas entranhas da terra.

Bom, depois desta divagação filosófico-espiritual, onde ia eu?
Ah sim, constato após reler o texto acima - e que bom poder reler, e não precisar de me lembrar de tudo! no telefonema.
Desligada a chamada, fechei então o estore, ainda que não totalmente pois só queria fazer uma sesta, e deitei-me… Não sei se dormi algo, mas descansei.perto de hora e meia.
Entretanto lembrei-me, ao ver o saco da roupa suja, que tinha falado no dia anterior em pôr a roupa a lavar. Peguei no saco, perguntei se podia às técnicas de serviço (as mesmas que me acolheram no dia anterior), foram buscar o detergente à área de “staff” e a assistente social, aqui elas fazem um bocadinho de tudo, pelo que uso a categoria profissional só para distinguir uma da outra, neste toque de escrita realista e só para não inventar nomes nem sentir necessidade de pedir autorização para escrever sobre elas, pelo menos por enquanto, bom, a técnica/humana em causa veio com dois copos com liquidos, com uma certa viscosidade, coloridos e relembrou-me o caminho até à lavandaria, pois eu já não me lembrava onde era, e explicou-me como usar a máquina da roupa e indicou o estendal que poderia utilizar. Um copo era o detergente e outro o amaciador, ficará certamente mais macia aqui do que costuma em casa já que não costumo usar amaciador!
Liguei a máquina e fui novamente para a sala continuar a ler.
Uma residente que se tinha ausentado no fim de semana e que eu ainda não tinha conhecido veio apresentar-se. Apresentei-me de volta.

Entretanto eram 17h e era tempo do espaço criativo.
Estavam já quase todos nos sofás e eu juntei-me a eles.
As técnicas propuseram uma ou duas curtas metragens, perguntando se tinhamos alguma outra ideia de curtas para ver, e perante uma resposta negativa avançámos.
A primeira era uma curta sobre a “violência no namoro”. Que raios pensei eu, então as pessoas aqui em fase de recuperação e nós a vermos videos sobre violência. O que motivará tal escolha? Será que algumas das mulheres aqui presentes já passou por isso? Porquê a necessidade de trazer este tema?
E ao mesmo tempo refleti que era importante as pessoas terem à mesma a sua capacidade crítica e sobre a importância de se falar sobre estes temas, para que os mesmos venham ao de cima e possa haver alguma transformação social.
A violência que a curta de animação tratava era em especifico do homem para a mulher e mais psicológica, de posse, e não física…um homem, com um corpo volumoso e uma mulher esguia. E depois diversas situações, em que ela parecia delegar a sua autoridade nele. Seja na escolha do vestido para irem sair à noite, na sua própria alimentação, em estar a divertir-se com as amigas em vez de estar com ele…enfim…Ele a reagir negativamente a muitas das opções dela e ela a ceder.
Terminada esta curta foi aberto o espaço de “debate”/partilha.
Iniciei o mesmo, numa comunicação que olhando para trás, me pareceu algo dispersa e dificil de acompanhar, falando da comunicação violenta usada predominantemente na nossa sociedade e da possibilidade de uma comunicação não-violenta (já existindo tb métodos específicos para tal), do domínio da cultura patriarcal, antecedida pelo matriarcado (Rousseau? Terá sido ele quem escreveu sobre isso e que eu li em tempos?) e que agora já tinha ouvido falar de uma nova cultura de arquiarcado. Falei tb que a violência podia ser em todos os tipos de relação amorosa e nas várias direções: home para mulher, mulher para homem, mulher para mulher, homem para homem. E para que ninguém fique de fora, acrescento agora, não o tendo dito, de seres que se afirmam “sem género” para outros e vice-versa também.
E podia ainda acrescentar as relações entre pais e filhos. Aliás, após uma partilha de história pessoal-familiar po outra residente, que aqui não desenvolvo, falámos tb como a violência era passada entre gerações. Falei da importância da rede de suporte, e falaram também da relevância do trabalho individual neste processo de quebrar os ciclos inter-geracionais.
Lembro-me apenas da intervenção de dois residentes e das duas técnicas. Observei a expressão de duas das outras residentes que estavam bem sérias, perguntando-me eu se elas já teriam vivido algo similar.
Eu próprio refleti sobre as minhas relações…e também já tive muitas vezes comunicação violenta e já fui alvo da mesma também.
Felizmente não caí naqueles exageros retratados pelo vídeo.
Além disso lembro-me de ter divagado um pouco, quando falava no quebrar dos ciclos, de como a existência de bairros sociais, para onde vão pessoas que estão mais propensas a um determinado estilo de vida/condição social e relações mais violentas (mais tarde refleti de onde tirei essa ideia…e observo que tenho a crença de que nestes lugares há mais crime e violência do que noutros, parte provavelmente inspirado por filmes americanos que retratam os negócios de droga nestes bairros, parte pq faço uma associação entre viver num bairro social a ter menos dinheiro e condições de vida algo degradantes. Assumo que tenho em mim algum preconceito e que provavelmente nem todos os que ali vivem são violentos e que haverá tb pessoas que procuram a paz - interior e exterior).
Terminei a divagação falando da saúde mental e de as pessoas serem internadas e isoladas da sociedade, sem poder sair. Observei e refleti depois sobre esta minha partilha e como provavelmente desenvolvi trauma com essa experiência. Pensei também que de certa forma esta casa também agrupa pessoas que passaram por experiencias similares (em condições bem-diferentes) e pensei que secalhar aquele não era o momento para falar disso.

Seguiu-se outra curta, após um período de pausa técnica em que a tv deixou de funcionar (mais tarde soube que teria sido devido a sobre-aquecimento da box, já que voltou a funcionar depois), e que passámos para o computador.
Vimos a curta portuguesa “Ice merchants”…
Tive alguma dificuldade em acompanhar a história, não verbal, apanhando apenas algumas partes. No fim nova partilha e já mais pessoas participaram. Aqui o convite foi a dizer o que tinhamos captado da historia. Através da partilha fiquei a perceber mais da história e foi interessante ver como cada pessoa captou diferentes momentos.
Depois deste momento seguiu-se uma distribuição das tarefas da casa pelos presentes para a semana que se avizinhava.
Fui entretanto pendurar a minha roupa e ao voltar voltei a falar com a residente que se tinha vindo apresentar. Antes disso tinha ficado a saber que ela morava na mesma zona que eu e isso serviu de inicio de conversa.
Entretanto vieram-nos dizer que quando quisessemos podiamos ir jantar. Fômos após alguns instantes.
Jantei arroz vaporizado com nuggets de frango. À sobremesa a mousse. Interessante tb foi observar as dinâmicas em torno da mousse. Um residente a repetir, uma técnica a chamar a atenção de que nem todos tinham comido. Uma outra residente - com quem estive à conversa - a lembrar noutros momentos que eu ainda não tinha comido. E foi bom saber novamente que alguém se preocupa com o meu bem-estar.
Findo o jantar e lavada a loiça, juntei-me novamente à conversa com a mesma pessoa e encontrámos mais elos de ligação e tivémos um bonito momento de partilha.
Recolhi-me e fui dormir.
8h38 - 2h11 minutos… Ai que já estou atrasado! Tempo de me lavar rapidamente e comer para chegar a horas ao encontro comunitario as 9!