PARTE II
Organização económica
TÍTULO I
Princípios gerais
Artigo 80.º
Princípios fundamentais
A organização económico-social assenta nos seguintes princípios:
a) Subordinação do poder económico ao poder político democrático; b) Coexistência do sector público, do sector privado e do sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção; c) Liberdade de iniciativa e de organização empresarial no âmbito de uma economia mista; d) Propriedade pública dos recursos naturais e de meios de produção, de acordo com o interesse colectivo; e) Planeamento democrático do desenvolvimento económico e social; f) Protecção do sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção; g) Participação das organizações representativas dos trabalhadores e das organizações representativas das actividades económicas na definição das principais medidas económicas e sociais.
Artigo 81.º
Incumbências prioritárias do Estado
Incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social:
a) Promover o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas, no quadro de uma estratégia de desenvolvimento sustentável; b) Promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal; c) Assegurar a plena utilização das forças produtivas, designadamente zelando pela eficiência do sector público; d) Promover a coesão económica e social de todo o território nacional, orientando o desenvolvimento no sentido de um crescimento equilibrado de todos os sectores e regiões e eliminando progressivamente as diferenças económicas e sociais entre a cidade e o campo e entre o litoral e o interior; e) Promover a correcção das desigualdades derivadas da insularidade das regiões autónomas e incentivar a sua progressiva integração em espaços económicos mais vastos, no âmbito nacional ou internacional; f) Assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral; g) Desenvolver as relações económicas com todos os povos, salvaguardando sempre a independência nacional e os interesses dos portugueses e da economia do país; h) Eliminar os latifúndios e reordenar o minifúndio; i) Garantir a defesa dos interesses e os direitos dos consumidores; j) Criar os instrumentos jurídicos e técnicos necessários ao planeamento democrático do desenvolvimento económico e social; l) Assegurar uma política científica e tecnológica favorável ao desenvolvimento do país; m) Adoptar uma política nacional de energia, com preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico, promovendo, neste domínio, a cooperação internacional; n) Adoptar uma política nacional da água, com aproveitamento, planeamento e gestão racional dos recursos hídricos.
Artigo 82.º
Sectores de propriedade dos meios de produção
- É garantida a coexistência de três sectores de propriedade dos meios de produção.
- O sector público é constituído pelos meios de produção cujas propriedade e gestão pertencem ao Estado ou a outras entidades públicas.
- O sector privado é constituído pelos meios de produção cuja propriedade ou gestão pertence a pessoas singulares ou colectivas privadas, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
- O sector cooperativo e social compreende especificamente:
a) Os meios de produção possuídos e geridos por cooperativas, em obediência aos princípios cooperativos, sem prejuízo das especificidades estabelecidas na lei para as cooperativas com participação pública, justificadas pela sua especial natureza; b) Os meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais; c) Os meios de produção objecto de exploração colectiva por trabalhadores; d) Os meios de produção possuídos e geridos por pessoas colectivas, sem carácter lucrativo, que tenham como principal objectivo a solidariedade social, designadamente entidades de natureza mutualista.
Artigo 83.º
Requisitos de apropriação pública
A lei determina os meios e as formas de intervenção e de apropriação pública dos meios de produção, bem como os critérios de fixação da correspondente indemnização.
Artigo 84.º
Domínio público
- Pertencem ao domínio público:
a) As águas territoriais com os seus leitos e os fundos marinhos contíguos, bem como os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis ou flutuáveis, com os respectivos leitos; b) As camadas aéreas superiores ao território acima do limite reconhecido ao proprietário ou superficiário; c) Os jazigos minerais, as nascentes de águas mineromedicinais, as cavidades naturais subterrâneas existentes no subsolo, com excepção das rochas, terras comuns e outros materiais habitualmente usados na construção; d) As estradas; e) As linhas férreas nacionais; f) Outros bens como tal classificados por lei.
- A lei define quais os bens que integram o domínio público do Estado, o domínio público das regiões autónomas e o domínio público das autarquias locais, bem como o seu regime, condições de utilização e limites.
Artigo 85.º
Cooperativas e experiências de autogestão
- O Estado estimula e apoia a criação e a actividade de cooperativas.
- A lei definirá os benefícios fiscais e financeiros das cooperativas, bem como condições mais favoráveis à obtenção de crédito e auxílio técnico.
- São apoiadas pelo Estado as experiências viáveis de autogestão.
Artigo 86.º
Empresas privadas
- O Estado incentiva a actividade empresarial, em particular das pequenas e médias empresas, e fiscaliza o cumprimento das respectivas obrigações legais, em especial por parte das empresas que prossigam actividades de interesse económico geral.
- O Estado só pode intervir na gestão de empresas privadas a título transitório, nos casos expressamente previstos na lei e, em regra, mediante prévia decisão judicial.
- A lei pode definir sectores básicos nos quais seja vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza.
Artigo 87.º
Actividade económica e investimentos estrangeiros
A lei disciplinará a actividade económica e os investimentos por parte de pessoas singulares ou colectivas estrangeiras, a fim de garantir a sua contribuição para o desenvolvimento do país e defender a independência nacional e os interesses dos trabalhadores.
Artigo 88.º
Meios de produção em abandono
- Os meios de produção em abandono podem ser expropriados em condições a fixar pela lei, que terá em devida conta a situação específica da propriedade dos trabalhadores emigrantes.
- Os meios de produção em abandono injustificado podem ainda ser objecto de arrendamento ou de concessão de exploração compulsivos, em condições a fixar por lei.
Artigo 89.º
Participação dos trabalhadores na gestão
Nas unidades de produção do sector público é assegurada uma participação efectiva dos trabalhadores na respectiva gestão.